terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Miracula aeternitatis


"Aquilo que foi é como o que era.
E aquilo que era é como o que foi."


Olhares irresistíveis se cruzaram. Havia uma tensão pairando no ar e ninguém sabia o motivo. Somente ela. Os dois se aproximaram. Corpos em chamas e ele mal sabia: estava tão apaixonado pela mulher à sua frente que se tornou extremamente cego. Seus olhos só a viam: os cabelos ruivos, a boca pequena, a presença cada vez mais forte em qualquer cômodo que entrasse. "Sou sua..." era a única coisa que ouvia. Era só o que os tão delicados lábios avermelhados sussurravam. Eles se abraçaram e uma dança silenciosa os envolveu. Qualquer um diria que eram pessoas prestes a cometer adultério. E eram. Dois amantes sem outros parceiros. Amantes...
Ela o apertou contra o seio e esperou o homem ficar sem reação. Ele aspirou o doce cheiro que emanava dos cabelos desgrenhados e, com os dedos, passeou pelo braço dela até chegar ao pescoço. Aquela pele tão macia embaixo de seus dedos calejados... Aquela mulher cortejada por toda a sociedade que os rodeava – aquela patética sociedade  estava lá para ele. Acreditando que ela o pertencia.
"Sinto pena de você", pensava ela, acariciando-o também.

"O que está em cima é como o que está abaixo,
para realizar os milagres."


A tensão aumentou. Apertando-o ainda mais contra o peito, esperou que ele a beijasse. Não demorou para que isso ocorresse e ela se preparou. Quando percebeu que ele estava extasiado, retirou o punhal escondido em seu vestido e sorriu. A hora chegou. Então respirou profundamente e, murmurando palavras que ele não compreendeu, cravou-lhe a arma nas costas. Num primeiro momento houve apenas o susto, mas logo ele percebeu o acontecera. Traição. Pura e simples traição. E ele não conseguiu pronunciar nenhuma palavra. Sem se mover, ela esperou o corpo cair ao chão. O punhal em suas mãos delicadas e sujas de sangue. Com um sorriso malicioso, ela observou a vida o abandonar num último suspiro. Rondou o corpo, abaixou-se e tocou o rosto do homem, antes de tocar o lugar em que o apunhalara. Ainda com o sorriso, saiu do recinto, deixando para trás aquele corpo sem vida.

"O que está abaixo é como o que está acima,
para realizar os milagres."