Você acorda e percebe que não
deveria ter aberto os olhos naquela manhã. Sente que as coisas continuarão dando errado e tenta dormir novamente. Vã tentativa. Se mexe na cama
várias vezes até que desiste e levanta. O banheiro parece distante e escuro,
mas você caminha confiante e escancara a porta, ligando a torneira e jogando água no rosto para acordar completamente. O dia, nublado, condiz com seus pensamentos ao acordar. "Pegue aquela lâmina", eles dizem. Uma luta invisível é travada dentro de sua cabeça, até que ela é vencida – pelo menos aquela batalha foi – e então desce para tomar café.
Ela não está mais lá para
fazer seu café. Parado, olha para a cafeteira e lembra do sorriso que ela
sempre lhe lançava, o sorriso mais lindo que vira em toda a sua existência... Para em seguida recordar das lágrimas que caiam dos olhos dela na última vez que a vira. Você balança a cabeça negativamente e
faz seu café, descontente. Arruma-se para ir ao trabalho e sai com o carro. A
rua está deserta, mas você nem nota que não há nenhuma alma viva caminhando.
Ninguém. E então, praticamente no meio do caminho, depois de quase meia hora de
viagem, lembra que é feriado e, portanto, não haverá expediente.
– Meu Deus... – murmura para si
mesmo, entredentes.
Você respira profundamente e
retorna para casa, por um caminho diferente. Era ela que estava em seu
pensamento. O tempo parou de trabalhar depois que ela se foi e só deixou
lembranças que invadem a cabeça sem nenhuma introdução de que isso irá acontecer. De maneira vivida, recorda do dia em que chegou em casa depois do trabalho e a viu retirando todas
as coisas do armário. O vestido vermelho – que você tanto
censurou, mas que adorava secretamente por contrastar com a pele branca e macia
que ela tinha – jogado numa das malas. As lingeries que ela usava para seduzir e que você amava tirá-las devagar nos momentos entre quatro paredes.
E
as lágrimas novamente.
Você sente vontade de chorar ainda no carro, mas afasta qualquer pensamento que deixe aquele nó horrível na garganta. Finalmente estaciona em casa e, com má
vontade, entra e caminha automaticamente para o quarto. A presença dela parece cada vez
mais viva ali dentro, mas você não consegue se desfazer de
nada. Absolutamente nada.
No quarto, o corpo inerte cai na cama e você esconde o rosto no travesseiro. E, ali, as lágrimas começam a cair descontroladamente. Depois de muito tempo, desde que ela se fora,
você se permite fazer isso.
Então o sono vem, em meio às lágrimas e à saudade de sua esposa.